Efeitos práticos da decisão sobre Acordos Individuais da MP 936

1 – INTRODUÇÃO
A Medida Provisória (MP) nº. 936 trouxe para a área laboral a possibilidade de adoção de medidas, como a suspensão do contrato e a redução a jornada de trabalho e do salário, a fim de preservar o emprego e a renda, de garantir a continuidade das atividades laborais e empresariais e, por consequência, reduzir o impacto social decorrente da calamidade pública e da emergência de saúde pública.
Por ser uma norma criada durante um estado de calamidade pública, de emergência da saúde e durante uma pandemia mundial, trouxe elementos que possibilitaram a aplicação do que ali estava disposto de forma mais rápida, para que produzisse os efeitos desejados e os objetivos previstos mais rapidamente.
Contudo, isto não impediu que ocorressem questionamentos sobre a constitucionalidade (ou mesmo validade) das hipóteses elencadas na MP. A seguir, serão levantados questionamentos, de ordem prática, considerando o disposto na Medida Provisória 936 e a posição adotada pelo STF no julgamento da liminar da Ação Direta de Constitucionalidade (ADI) nº. 6363.
2 – QUESTÕES PRÁTICAS ACERCA DOS ACORDOS PARA SUSPENSÃO E REDUÇÃO DE JORNADA E SALÁRIO.
Logo em seguida a publicação da Medida Provisória 936, foi apresentado ao Supremo Tribunal Federal, através da Ação Direta de Constitucionalidade (ADI) nº. 6363 o questionamento sobre a MP 936, especificamente quanto ao seu artigo 11, parágrafo (§) 4º, se este estaria de acordo com as previsões constitucionais, especialmente quanto ao previsto no artigo 7º, inciso VI, da Constituição Federal. Referida previsão constitucional define como um dos direitos fundamentais do trabalhador que apenas com a participação dos Sindicatos, por meio de Convenção ou Acordo Coletivo, a possibilidade de redução salarial.
Pois bem. Havia sido proferida decisão, pelo Ministro Relator do processo, Ricardo Lewandowski, alterando a forma de interpretação do citado parágrafo da MP 936. Posteriormente, o mesmo alterou sua interpretação após recurso da Advocacia Geral da União. Vejamos as interpretações do ministro:
1ª Interpretação → Condicionava a validade dos Acordos Individuais à manifestação dos Sindicatos, fosse ela a favor ou contra → Isto quer dizer que se o Sindicato fosse comunicado, todavia não falasse nada o Acordo Individual seria invalidado;
2ª Interpretação → Reconheceu a validade imediata dos acordos individuais já celebrados entre empregado e empregador, contudo ressalvou que caso houvesse norma coletiva posterior esta passaria a ter validade sobre os acordos Individuais, respeitado o Princípio da Norma mais favorável.
Para sanar os questionamentos acerca da interpretação sobre o parágrafo 4º, do artigo 11, da Medida Provisória, o Pleno do STF, então, votou a Liminar da Ação Direta de Constitucionalidade nº. 6363 e decidiu que o referido parágrafo é constitucional, portanto, é valido em sua integralidade. Podem, assim, serem celebrados acordos individuais mesmo sem a manifestação dos Sindicatos. Lembre-se, entretanto, que foi mantida a necessidade de comunicação do Sindicato, no prazo de 10 (dez) dias, após a celebração do Acordo. Mas, quais os efeitos práticos dessa decisão? Podemos elencar três efeitos principais, a seguir dispostos:
Efeito 1: A empresa realizou o Acordo Individual com seu empregado, comunicou ao Sindicato e este concordou → Acordo Individual Válido.
Efeito 2: A empresa realizou o Acordo Individual com seu empregado, comunicou ao Sindicato e este não se manifestou → Acordo Individual Válido;
Efeito 3: Empresa comunicou ao Sindicato do acordo realizado, mas este discordou:
Discordou com ou sem fundamento, mas não abriu negociação com a empresa → Acordo Individual Válido;
Discordou, abriu negociação com a empresa, mas não concluiu esta no prazo → Acordo Individual Válido;
Discordou, abriu negociação, fechou acordo coletivo/convenção coletiva dentro do prazo → Validou o Acordo Coletivo/Convenção Coletiva.
Salienta-se que o prazo para o Sindicato realizar negociação coletiva com a empresa foi reduzido pela metade, conforme disposto no artigo 17, inciso III, da MP 936. Isto quer dizer que o prazo do artigo 614 da CLT, passa a ser de 4 (quatro) dias, nos casos em que tratar dos benefícios emergências de garantia do emprego e da renda. Logo, se o Sindicato discordar do Acordo Individual e abrir negociação coletiva terá o prazo de 4 (quatro) dias para encerrá-la e registrar a norma coletiva perante o órgão competente.
Destarte, a empresa deve observar também o prazo de 10 (dez) dias para comunicar ao Sindicato sobre a existência do Acordo Individual. Mas como a empresa pode comunicar o Sindicato? Por correspondência escrita endereçada ao Sindicato, por meios eletrônicos, como email e whatsapp, ou qualquer outro que possibilite a ciência do Sindicato, como prevê o artigo 17, inciso II, da MP 936.
A empresa necessita, portanto, ter a comprovação de que notificou o Sindicato dentro do prazo e os meios eletrônicos se mostram os mais viáveis, céleres e adequados no atual cenário de pandemia. Resumidamente os prazos são:
Prazo para a empresa comunicar o Sindicato após o Acordo Individual → 10 dias;
Prazo para o Sindicato abrir a negociação, realizar a mesma e protocolar junto ao órgão competente → 4 dias.
E se a empresa não comunicar o Sindicato da existência de um Acordo Individual? O acordo poderá ser considerado nulo, logo, será inválido, não produzindo efeitos e a ainda empresa terá que pagar ao empregado o seu salário integral, sem o benefício do governo.
Ademais, após essa validação do acordo individual ou da negociação coletiva a empresa não deve esquecer que possui prazo de 10 (dez) dias para informar ao Ministério da Economia, através do Empregador Web, quais os empregados receberão os benefícios emergenciais e de que forma estes foram celebrados (acordo individual ou coletivo).
Sanada a questão da validade do acordo individual para concessão dos benefícios emergenciais de manutenção do emprego e da renda, outra questão possui relevância. Desta forma, o acordo individual previsto na MP 936 pode ser aplicado para todos os empregados? A resposta é não.
Explica-se. A medida provisória visando garantir a menor perda possível para os trabalhadores e maior segurança jurídica para as empresas estabeleceu critérios para concessão ou não dos benefícios por meio de Acordo Individual. São eles:
Quem ganha salário igual ou inferior a R$3.135,00 → Benefícios implantados por Acordo Individual ou Negociação Coletiva (Acordo ou Convenção Coletiva);
Quem tem Diploma de Nível Superior com salário igual ou superior a R$12.202,12 (duas vezes o teto do INSS) → Acordo Individual ou Negociação Coletiva;
Aos que recebem mais de R$3.135,00 e menos de R$12.202,12 → Apenas por Acordo ou Convenção Coletiva.
Frisa-se, ainda, que para as empresas que possuem Acordo ou Convenção Coletiva, ainda vigentes, poderão viabilizar a suspensão contratual ou redução de jornada e salário por meio de um Aditivo a esta norma em vigor, o que poderá ser mais célere e viável para empregado e empregador.
Outro ponto interessante a ser colocado diz respeito a possibilidade da empresa conceder ajuda compensatória mensal superior àquela que é obrigada por força da sua receita bruta. A medida provisória previu que caso a receita bruta da empresa tenha sido superior a R$4.800.000,00, no ano-calendário 2019, esta deverá, obrigatoriamente, arcar com 30% do valor correspondente ao salário do empregado ficando o restante a cargo do governo federal.
E se o empregador puder e quiser auxiliar o empregado com um valor superior, pode? Sim, perfeitamente possível a concessão de uma ajuda compensatória superior ao mínimo estabelecido na norma.
Por exemplo, empregado recebe R$10.000,00 por mês de uma empresa que possuiu receita bruta superior aos R$4.800.000,00 em 2019 e, por isso, a sua empregadora terá que arcar com o mínimo de 30% a título de ajuda compensatória calculada sobre o salário do mesmo, caso o contrato de trabalho seja suspenso, e o restante será subsidiado pelo governo, nos termos da Medida Provisória.
Além disso, considerando que o valor a ser recebido por este trabalhador, durante a suspensão contratual, será bem inferior ao que costuma receber, a empresa resolve conceder mais 10% de ajuda, por sua mera liberalidade. Isto quer dizer que a empresa pagará 40% de ajuda para este trabalhador.
No exemplo acima, como a empresa poderia viabilizar esse pagamento a maior? Deveria registrar em um acordo individual ou coletivo? Pelo caráter da ajuda e para que a empresa possa se utilizar dos benefícios trazidos pela medida é recomendável que a empregadora registre o pagamento deste complemento na ajuda compensatória ou via acordo individual ou via acordo coletivo.
Orienta-se, neste caso, que a negociação coletiva é mais recomendada, já que possibilitaria o alcance de um maior número de empregados, com critérios de pagamento mais claros e, por sua vez, com maior segurança jurídica para a empresa.
E qual a natureza jurídica deste complemento compensatório? Conforme disposto na MP, artigo 9º, inciso II, a ajuda compensatória tanto de 30% quanto a complementar possuem natureza indenizatória.
3 – CONCLUSÃO
A Medida Provisória 936 trouxe a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho e de redução da jornada e do salário, de forma regulamentada, com o objetivo maior de manter os postos de trabalho, manter a saúde econômica das empresas e, com isso, diminuir os impactos sociais. E, de tal modo, que as medidas devem ser vistas e colocadas em prática, sempre na busca do melhor para empregado e empregador, já que estes são as molas propulsoras da sociedade e da economia do país.
Por isso, a empresa deve observar e respeitar as disposições da Medida emergencial criada pelo governo, assim como tudo que quiser conceder aos seus empregados que o faça por meio do registro em Acordo (individual ou coletivo), com o fito de haver maior segurança jurídica às medidas tomadas, igualmente como prevenir os riscos jurídicos pós-pandemia.
Os empregados, por sua vez, garantirão a manutenção dos seus empregos e rendas, diante de um cenário incerto, com as garantias previstas na MP, como a estabilidade provisória em caso de adoção de um dos benefícios (suspensão ou redução contratual) e a perda mínima de renda. Neste último caso, é o que ocorrerá com a maior parte dos trabalhadores, já que a média de renda da população é de R$2.375,00, conforme dados do IBGE.
Desta forma, deve-se pautar a aplicação prática das regras pelo bom senso, pelo acordo de vontade entre as partes, garantindo a continuidade das atividades laborais e empresariais e preservando o emprego e a renda.

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